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Bocão 64

domingo, 21 de agosto de 2022

Caminhos e descaminhos da Educação no Brasil


Diante de tantos desafios que o Brasil tem enfrentado nos últimos anos – pandemia e a discussão sobre vacinas, retorno da inflação, governo errático, para ficarmos só com alguns –, talvez a educação seja o maior deles. Porque a crise na educação brasileira não é recente, não é de hoje, apesar de ter sido exponenciada nos últimos anos – e o País ter cinco ministros da área em menos de quatro anos talvez seja a síntese da crise educacional pela qual o Brasil enveredou. Não vale falar aqui de questões pastorais, disputa de influências e pedidos e propostas canhestras. Tudo isso é mais consequência do que causa. O fato é que a educação brasileira é como um grande e pesado avião que tem tido vários percalços em sua viagem rumo ao futuro. Só que, diferentemente das viagens dos aviões de carreira, a turbulência intermitente é a regra, não a exceção. E o destino ainda parece incerto.

No livro A Escola Pública em Crise, resultado de um seminário internacional realizado em 2019 na Faculdade de Educação da USP (FE-USP), é dito na apresentação: “Entendemos que o campo da educação e a escola pública mais especificamente vivem uma crise histórica”. Mas, afinal, que crise é essa que tem na escola pública seu ponto de partida mas não se resume a ela? “Naquele momento, entendíamos que havia uma crise estrutural, que tinha a ver já com um governo federal que assumiu o poder desprovido de qualquer compromisso com uma pauta educacional. Entendíamos que o Brasil estava sem projeto e sem rumo no tocante às políticas educativas. Acreditamos que o cenário que visualizávamos naquele ano de 2019 apenas se aprofundou”, explica a professora e pesquisadora da FE Carlota Boto, uma das organizadoras do volume. 

“Nos últimos anos, nós tivemos sucessivas trocas de ministros da Educação, sem que houvesse uma diretriz sobre qual é a orientação a ser dada para a melhoria do ensino público. Se nós perguntarmos quais são as prioridades das políticas públicas no campo da educação, não saberemos responder a essa pergunta”, avalia ela. Já para Bernardete Gatti, conselheira da Câmara de Educação Superior e integrante do Comitê Consultivo da Cátedra Alfredo Bosi de Educação Básica do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP, o desafio é “privilegiar o bem comum, o bem público, o respeito à diversidade, mantendo princípios éticos e sociais, sem desesperançar”. “O panorama hoje se nos apresenta repleto de dilemas desorientadores”, afirmou ela em recente entrevista ao Jornal da USP.

Entre esses dilemas parece estar a inescapável questão tecnológica e o chamado letramento digital – tanto solução quanto problema quando o quadro a ser compreendido é o da educação. Para o professor sênior do Instituto de Física da USP (IF) e coordenador acadêmico da Cátedra Alfredo Bosi de Educação Básica do IEA, Luís Carlos de Menezes, se os anos de pandemia “escancararam e aprofundaram as desigualdades do País, especialmente na educação”, eles também tiveram outro condão: “difundir recursos tecnológicos de informação e comunicação que se mostraram importantes para o ensino”, afirmou ele recentemente ao Jornal da USP. E aí talvez residam o problema e o dilema tecnológico. O pesquisador e professor da Faculdade de Educação Ocimar Alavarse comenta que os dados indicam uma defasagem na leitura e resolução de problemas matemáticos por parte dos alunos. “Essas duas competências são muito importantes”, diz. “A capacidade de leitura interfere no aproveitamento de todas as disciplinas da escola, assim como na resolução de problemas, que, embora associada à matemática, diz respeito à lógica e ao raciocínio”, afirmou ele, em entrevista à Rádio USP, sobre a mudança no Ensino Médio. 

Sem planejamento, sem futuro?
Políticas públicas: talvez essas sejam as palavras mágicas que poderiam abrir as portas para um futuro mais promissor da educação no Brasil – e para todos os envolvidos, não só na escola básica, mas em todos os níveis. Mas essas palavras parecem esquecidas, em um mutismo governamental que não vem necessariamente de hoje. E isso, ao se falar de um Ministério da Educação que tem uma verba de quase R$ 160 bilhões. Mas o problema, aparentemente, não é falta de dinheiro. “O problema da educação no Brasil é um problema que envolve, sim, o financiamento. Mas envolve também o uso da verba. A impressão que dá é a de que o MEC hoje não sabe onde aplicar seus recursos. Não há projetos, não há diretriz, não há orientação. Falta interesse em investir na educação pública”, analisa Carlota Boto. “Esse atual governo federal não tem projeto para a educação. Aquilo que foi desenhado pelos últimos governos também não ajuda. A BNCC do Ensino Médio, por exemplo, desmontou com as disciplinas clássicas dessa etapa de ensino. Assim, pode-se perguntar como se dará a formação de um jovem, se essa formação não contempla uma sólida base de História, de Filosofia e de Geografia, para citar somente três exemplos”, afirma a professora da Faculdade de Educação, se referindo à Base Nacional Comum Curricular, o instrumento de caráter normativo que define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da educação. 

Nessa falta crônica de planejamento – que coloca em risco um futuro mais tangível para milhões de brasileiros – acaba-se, também, se perdendo aquilo que foi conquistado. É o caso do Inep, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. O instituto – que leva o nome de um dos principais educadores da história brasileira, ao lado de nomes como Paulo Freire e Darcy Ribeiro, que não encontraram sucessores do mesmo nível em um passado recente – fornece a base de dados para a realização de levantamentos estatísticos e avaliações em todos os níveis e modalidades de ensino, como o Enem. Mas a recente crise no Inep, no final do ano passado, quando um grupo de servidores do instituto – às vésperas do Enem – solicitou afastamento alegando “falta de comando técnico” e “clima de insegurança e medo”, colocou todo o trabalho em risco. 

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